quinta-feira, 26 de maio de 2011

Por que Idalina foi para o Japão...

Para Renato Mascarenhas de Souza Filho



Desde o início, eu sabia que aquilo não ia dar certo. Só não falei nada, pra não parecer que eu estava tentando atrapalhar os planos dela. A sua família, então, que adora falar mal de mim, iria dizer logo que é isso mesmo, que eu sou uma asa-negra, sou um estraga-prazeres, um caga-na-saquinha e mais uma enxurrada de pejorativos formados por palavras compostas, como essas que acabei de citar. Ela mesma chegou a jogar na minha cara que eu estava era com ciúme, medo de perdê-la para algum megainvestidor da Bolsa de Tóquio. Bobagem, vê se um nipomilionário iria se interessar por ela. Eu só estava querendo que ela investisse melhor as suas economias, mesmo que gastasse parte delas em viagens, que era o seu grande sonho.
Me diz com franqueza: o que Idalina iria fazer no Japão? Não perdeu nada lá. Dizia que era coisa ancestral, que um bruxo tinha dito que em outra encarnação ela havia sido uma gueixa famosa. Soube que ele até levou uma grana dela, depois de ter dito isto. Na seqüência, um outro bruxo, que até cobrou bem mais caro por seu serviço, falou que ela tinha sido a esposa favorita de um imperador japonês, cujo nome eu nunca soube ou não lembro mais, agora. Só sei que eu tinha um mau pressentimento, a cada vez que ela me falava nessa história de ir ao Japão. Fazer o que tão longe, se ela nunca viu um açude sangrando em Parelhas, aqui mesmo, no Rio Grande do Norte? Idalina não sabe a beleza de um tuiuiú, alçando vôo no Pantanal matogrossense. Cacete, excluindo a Disneyworld, por motivos óbvios, ela tinha todo o resto do planeta para conhecer. Então, por que o Japão?
Idalina começou a juntar dinheiro para a viagem, no final da década de 80. Quando o filho da puta do Collor entrou e confiscou a poupança dela, dava dó ver o estado de depressão em que ela ficou. Aliás, no fundo, eu até sentia uma certa pontinha de alegria, uma coisa meio perversa, sou obrigado a confessar, pois sabia que a viagem dela tinha ido por água abaixo. Mas a danada é tinhosa, logo deu a volta por cima. E assim que pode, começou a juntar dinheiro de novo. Quando dei por mim, ela já tinha a grana suficiente para as passagens e hospedagem por três meses. Fora um qualquer, pra circular e comparar bobagens.
No dia da partida, embora contrariado, aceitei participar do bota-fora, junto com alguns amigos dela, no aeroporto. Com direito a prosseco e balão de gás - imagine. Que mico horroroso! Depois que ela transpôs o portão de embarque, eu me despedi daquela gente, alegando pressa, e comecei a tomar um porre ali mesmo, num dos bares do Tom Jobim. Só cheguei em casa depois das sete da matina, e quase não lembro de nada do que ocorreu naquela noite. Passou-se mais de uma semana, para que ela fizesse o primeiro contato telefônico, me dando conta de sua chegada a Tóquio. Idalina falou algumas coisas incompreensíveis e explicou, como pode, que estava ainda meio aturdida com o fuso horário.
Depois, os telefonemas foram ficando cada vez mais esparsos, como cada vez mais difícil ficou compreender o que ela estava dizendo. Pelo o que me deu a entender, visitara Hiroshima e Nagazáki, tirando fotos dos respectivos monumentos às vítimas da bomba. Falava também de alguém que “si cagava”... “si catava”... não dava pra saber direito. Eu achava que as ligações é que não estavam muito boas.
Findos três meses e alguns dias ela voltou. Fui esperá-la no aeroporto e quase não a reconheci. Estava uma verdadeira gueixa. Dentro de um quimono estampado, calçava umas sandálias, tipo essas que a gente chama de havaianas, mas que na verdade surgiram no Japão. Os cabelos enrolados atrás, numa espécie de coque, eram transpassados por vários espetos de madeira. E aquele andar miudinho? Eu não sabia se ria ou se sentia pena da Idalina.
No táxi, a caminho de casa, eu já tive a percepção de que a coisas nunca mais seriam as mesmas entre nós. Pra começar, ela não havia propriamente aprendido o japonês, mas esquecera consideravelmente o idioma pátrio. Por exemplo: ao me contar que havia visto um jovem músico se apresentando numa casa noturna, em Tóquio, não soube dizer o nome do instrumento, mas me fez ver com as mãos que era um piano. Naquela mesma noite, eu percebi, também, que ela não sabia mais os nomes de algumas das coisas mais corriqueiras no seu cotidiano. Não conseguia mais nominar em nossa língua, coisas como xícara, cadeira ou vaso sanitário, por assim dizer. Não posso afirmar que a nossa comunicação, antes, era um primor, mas, agora, ser tornara quase impossível. Pensei que aquilo passaria com o tempo, mas vieram dias, semanas e até alguns meses, sem que Idalina voltasse a ser como era. Suas frases eram um emaranhado de português estropiado com japonês mal aprendido. E sempre vestida de gueixa, a andar apertadinho pelo meio da casa.
Mas, o pior veio depois. Idalina deu de reclamar do tamanho do meu membro. Me dizia que eu pareço um cavalo e que a machucava muito na hora do amor. Devo admitir que, neste ponto, eu nunca fui modesto, mas também não era nenhum superdotado. Posso garantir, ainda, que ele não deve ter crescido um milímetro sequer na ausência dela, como garanto que ela não reclamava disso antes. Com esse argumento cretino, a mulher passou a me evitar. Isso foi me irritando, me tirando o sono, até que numa noite eu explodi. Dei-lhe um esporro em regra, tentando botar ordem naquela confusão. Foi quando Idalina pulou da cama e, em posição de karateca, soltou um Haaaa! tão tenebroso, que deve ter acordado boa parte da vizinhança. De puto que fiquei, também me pus de pé. E sabe o que aconteceu? Idalina partiu pra cima de mim, com as mãos posicionadas em dois cutelos.
Só lembro que a primeira porrada foi na clavícula esquerda, que ficou esfacelada. Quase simultaneamente, mais duas cuteladas nas costelas, quebrando várias em cada lado. Acho que ao cair desacordado, joguei as pernas pra cima, o que ela aproveitou pra me fraturar a direita em dois lugares. Soube depois, que foi ela mesma quem chamou a ambulância, contando à equipe de saúde que eu havia caído de cima do armário, onde subira pra fazer uma demonstração de acrobacia. Demorei a entender como os caras tinham acreditado numa história dessas. Cheguei ao hospital em estado tão deplorável, que tive de tomar anestesia geral, pra que pudessem ministrar os procedimentos médicos.
Quando voltei a mim, na noite seguinte, estava atordoado. Sentia dor por todo o corpo, que estava engessado em cerca de 70%. Uma moça, muito atenciosa por sinal, fazia curativo no meu órgão genital, que também doía muito. Duas vezes por dia, uma enfermeira tomava os mesmos cuidados, sem que eu entendesse exatamente o que acontecera. Eu já li que na prática das artes marciais, não é permitido atacar o adversário naquela região que costumamos chamar de “países baixos”. Mas, convenhamos, Idalina está louca e, tomada de ira como estava, não devia ter levado em conta tais instruções. A julgar pela intensidade da dor que eu sentia, passei a imaginar a violência da cutelada que ela havia aplicado em meu pobre pênis.
Só alguns dias depois é que fiquei sabendo, por um companheiro de enfermaria já de alta, que minha mulher havia me visitado enquanto eu estava sob o efeito da anestesia. E pela conversa que ele ouviu dela com o doutor Onofre, ela havia premeditado a agressão, bem como o meu ingresso naquele hospital. E disse mais o ex-paciente: Idalina, mancomunada com aquele médico inescrupuloso (que há milhares deles por aí), mandara suprimir oito centímetros do meu membro, pra que ficasse do tamanho do pau do Kitagawa, um japonês safado que comeu ela, em Nagazáki.
Doutor, eu sei que o senhor é um profissional renomado, que o seu trabalho, como cirurgião plástico, é muito caro. Mas pode me restituir os oito centímetros que me roubaram, que eu prometo pagar-lhe o valor cobrado. É só o tempo de receber a indenização por perdas e danos, além de mutilação, que estou exigindo da Idalina e do tal doutorzinho na justiça. Pode acreditar, o juiz vai dar a sentença nos próximos três ou quatro meses.
09/08/2010

2 comentários:

  1. "Saudade - Palavra única....."

    Para descrever "Saudade" não há uma regra, norma ou padrão. Pode ser a "Saudade" de alguém, algum familiar ou amigo. Pode ser algo que existia e não existe mais ou foi modificado em sua cidade. Enfim, Saudade, é "Saudade" e cada um tem a sua!

    Exemplos de saudades já recebidas e que irão para o livro:

    Eu tenho saudades dos...
    "Domingos na cidade de Pingo D'água, de manhã ajudávamos a podar o campo com trator e roçadeira, aquele cheiro da grama cortada ainda ficou até hoje, e é só passar perto de alguém podando um jardim e a lembrança vem na hora, e a tarde era hora de dar espetáculo com a camisa do Juping no campo que cuidamos com muito carinho."
    Adilson Begatti- Cronista Esportivo e Metalúrgico
    Coronel Fabriciano-MG

    Eu tenho saudades do...
    "Do tempo em que a praça da cidade tinha espaço para as crianças ...lago com peixinhos. Os "coquinhos" caiam pelo chão e as crianças se divertiam tentando abrí-los para comer. O espaço de areia era disputado e ninguém se importava em sujar os pés...não se ouvia os gritos das mães desesperadas e irritadas pelos filhos que insistiam em gastar dinheiro no "pula-pula". A diversão era interminável e gratuita."
    Ana Karina Veiga - Jornalista - Professora e Estudante de Direito
    Santos Dumont-MG

    Eu tenho saudades do...
    "Bonde em Campinas (SP), um veículo totalmente aberto, um convite pra gente sentir a brisa no rosto. E os cobradores, então! Dobravam o dinheiro de forma vertical e o colocada entre os dedos. Era o maior barato. Pena que em minha cidade eles pararam de circular em 1969, deixando muita saudade!"
    Ariovaldo Izac - Cronista Esportivo
    Campinas - SP

    Eu tenho saudade dos...
    "Bailes de carnaval nos clubes da cidade, na década de 1980, onde a diversão era muito mais sadia.Também tenho muita saudade quando eu apresentava bailes nos clubes de Juiz de Fora e cidades vizinhas. Saudade da eterna rádio Mundial 860, onde sempre buscava os novos hits para tocar no meu programa radiofônico. Bons tempos..."
    Carlos Augusto de Oliveira (Guto) - Radialista
    Juiz de Fora-MG

    Eu tenho saudade da...
    "Velha 'maria fumaça', aquele trem de ferro que soltava fumaça e à noite enfeitava o céu com fagulhas, coisa muito linda. O apito da velha "12" também me dá uma grande saudade. Eu morava em Uruçuca, na Bahia e viajava para Itabuna naquele trem, que "morrendo" nas ladeiras, mas subindo cansado, ele chegava lá. Muito lindo!".
    Odoaldo Vasconcelos Passos - Economista
    (Belém-PA)

    Eu tenho saudade de...
    "Em Pirapora, minha terra natal, dos meios de transportes: o trem de Pirapora para Corinto, Montes Claros e Belo Horizonte bem como os vapores de Pirapora até Juazeiro, na Bahia e Petrolina, em Pernambuco".
    Paulo Roberto Caldeira Brant - Comentarista Esportivo
    Poços de Caldas - MG

    Eu tenho saudade das...
    "Partidas de futebol que o Santos Futebol Clube, do bairro Floresta, realizava no campo da Fábrica de Tecidos São João Evangelista e que a família Carbogim era base do time, com Zé Alemão, Gabriel e Rafael, além de meu sobrinho Flávio, como mascote"
    Miguel Carbogim - in memoriam

    Att,
    Carlos Alberto Fernandes Ferreira
    www.carlosferreirajf.blogspot.com
    Juiz de Fora-MG

    VEM AÍ...
    O Portal MULTIMÍDIA...

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  2. "Saudade - Palavra única....."

    Para descrever "Saudade" não há uma regra, norma ou padrão. Pode ser a "Saudade" de alguém, algum familiar ou amigo. Pode ser algo que existia e não existe mais ou foi modificado em sua cidade. Enfim, Saudade, é "Saudade" e cada um tem a sua!

    Exemplos de saudades já recebidas e que irão para o livro:

    Eu tenho saudades dos...
    "Domingos na cidade de Pingo D'água, de manhã ajudávamos a podar o campo com trator e roçadeira, aquele cheiro da grama cortada ainda ficou até hoje, e é só passar perto de alguém podando um jardim e a lembrança vem na hora, e a tarde era hora de dar espetáculo com a camisa do Juping no campo que cuidamos com muito carinho."
    Adilson Begatti- Cronista Esportivo e Metalúrgico
    Coronel Fabriciano-MG

    Eu tenho saudades do...
    "Do tempo em que a praça da cidade tinha espaço para as crianças ...lago com peixinhos. Os "coquinhos" caiam pelo chão e as crianças se divertiam tentando abrí-los para comer. O espaço de areia era disputado e ninguém se importava em sujar os pés...não se ouvia os gritos das mães desesperadas e irritadas pelos filhos que insistiam em gastar dinheiro no "pula-pula". A diversão era interminável e gratuita."
    Ana Karina Veiga - Jornalista - Professora e Estudante de Direito
    Santos Dumont-MG

    Eu tenho saudades do...
    "Bonde em Campinas (SP), um veículo totalmente aberto, um convite pra gente sentir a brisa no rosto. E os cobradores, então! Dobravam o dinheiro de forma vertical e o colocada entre os dedos. Era o maior barato. Pena que em minha cidade eles pararam de circular em 1969, deixando muita saudade!"
    Ariovaldo Izac - Cronista Esportivo
    Campinas - SP

    Eu tenho saudade dos...
    "Bailes de carnaval nos clubes da cidade, na década de 1980, onde a diversão era muito mais sadia.Também tenho muita saudade quando eu apresentava bailes nos clubes de Juiz de Fora e cidades vizinhas. Saudade da eterna rádio Mundial 860, onde sempre buscava os novos hits para tocar no meu programa radiofônico. Bons tempos..."
    Carlos Augusto de Oliveira (Guto) - Radialista
    Juiz de Fora-MG

    Eu tenho saudade da...
    "Velha 'maria fumaça', aquele trem de ferro que soltava fumaça e à noite enfeitava o céu com fagulhas, coisa muito linda. O apito da velha "12" também me dá uma grande saudade. Eu morava em Uruçuca, na Bahia e viajava para Itabuna naquele trem, que "morrendo" nas ladeiras, mas subindo cansado, ele chegava lá. Muito lindo!".
    Odoaldo Vasconcelos Passos - Economista
    (Belém-PA)

    Eu tenho saudade de...
    "Em Pirapora, minha terra natal, dos meios de transportes: o trem de Pirapora para Corinto, Montes Claros e Belo Horizonte bem como os vapores de Pirapora até Juazeiro, na Bahia e Petrolina, em Pernambuco".
    Paulo Roberto Caldeira Brant - Comentarista Esportivo
    Poços de Caldas - MG

    Eu tenho saudade das...
    "Partidas de futebol que o Santos Futebol Clube, do bairro Floresta, realizava no campo da Fábrica de Tecidos São João Evangelista e que a família Carbogim era base do time, com Zé Alemão, Gabriel e Rafael, além de meu sobrinho Flávio, como mascote"
    Miguel Carbogim - in memoriam

    Att,
    Carlos Alberto Fernandes Ferreira
    www.carlosferreirajf.blogspot.com
    Juiz de Fora-MG

    VEM AÍ...
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