É natural que eu morra todo dia:
Envolvido em súmulas
Corroído em ácido
Diluído em pó.
É natural que eu corra todo dia:
Dividido em dúvidas
Promovido a vítima
Consumido em som.
Naturalmente eu me sento
e lhe peço: não reclame
se ando meio distraído.
É que eu morro sem ser visto
e visto, sem ter morrido,
a urna toda de vidro.
Naturalmente eu lhe chamo
e pergunto, sonolento,
se você ainda é a mesma.
Afinal, eu fui gerado,
concebido e conservado
pra ser passado e traído
ou dar conta do recado.
É natural que eu saia todo dia:
Dirigido e tácito
Aguerrido ao cântico
Sem perder o tom.
É natural que eu caia todo dia:
Reprimido, em pânico,
Invertido em fórmulas
Inventado e só.
(1972)
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